O site Migalhas publicou, nessa quarta-feira (28), o artigo “IDPJ em Execução Fiscal: Complicações trazidas pela decisão do TRF3 no IRDR 0017610-97.2016.4.03.0000”, escrito pelo Coordenador da carreira de Procurador da Fazenda Nacional, Daniel Telles Menezes.
No texto, ele defende que o Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica (IDPJ) deve ser tido como inaplicável às execuções fiscais, bem como ao processo de conhecimento, restringindo seu âmbito de aplicação aos cumprimentos de sentença e às execuções de título extrajudicial regidas pelo procedimento codificado, ressalvada em todo caso a possibilidade de concessão de tutela antecipada de urgência nestes ritos quando imprescindível ao resguardo do interesse perquirido.
Leia abaixo o artigo na íntegra:
IDPJ em Execução Fiscal: Complicações trazidas pela decisão do TRF3 no IRDR 0017610-97.2016.4.03.0000
Os equívocos da decisão da Corte Regional, não apenas com base em uma incompatibilidade ontológica do instituto do Código de Processo Civil com o microssistema da execução fiscal, como também as contradições práticas decorrentes do entendimento adotado pelo Tribunal.
- IDPJ no Código de Processo Civil
O Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica, introduzido no ordenamento jurídico brasileiro pelo Código de Processo Civil (Livro III, Título III, Cap. IV) consiste em procedimento incidental cabível em todas as fases do processo de conhecimento, bem como no cumprimento de sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial1 a fim de deliberar sobre pedido de desconsideração da personalidade jurídica nos termos da lei material.2 Diz o código que o requerimento deverá demonstrar o preenchimento dos pressupostos legais para a desconsideração3, será contestado pela pessoa que se sujeitará à suspensão do véu corporativo, que poderá apresentar provas em sua defesa4 e, finalmente, será resolvido por decisão interlocutória.
A inovação em face da legislação de 1973 veio ao encontro de anseios de agentes econômicos que se ressentiam do efeito surpresa representado pela efetivação de medidas executivas em face de patrimônios distintos daqueles que haviam sido condenados em processo de conhecimento ou que figurassem no título executivo extrajudicial, conforme consta no relatório do PL 8046/10 que alude à intervenção juristas na discussão do projeto defendendo o instituto com tais argumentos. Em que pese a discussão não fosse nova e não tivesse encontrado amparo na jurisprudência construída ao longo dos anos sobre a aplicação das normas de desconsideração da personalidade – v.g. artigos 28, da lei 8.078/90, 4º da lei 9.605/98, 50 da lei 10.406/02, 34 da lei 12.529/11 – ganhou ânimo com o advento do novo diploma processual uma vez que neste a execução e o cumprimento de sentença passaram a contar com uma fase de impugnação independente da penhora (arts. 525 e 914) voltada à defesa do executado. Deste modo, o incidente buscou garantir a simetria dos meios de defesa disponíveis ao executado original e aqueles cuja responsabilidade se pretende impor à luz da teoria da desconsideração. Nada obstante o pragmatismo que parece emprestar consistência ao instituto, uma análise teórica aprofundada evidencia seu anacronismo.
- Apontamentos teóricos sobre a personalidade jurídica e sua desconsideração
Grassa na doutrina6 e jurisprudência7 incompreensão acerca da desconsideração da personalidade jurídica na medida em que se empresta à decisão que a veicula uma natureza condenatória ou desconstitutiva que não possui.
Como se sabe, a personalidade jurídica é atribuída aos contratos de sociedade pelo artigo 45 do Código Civil, o qual adota a teoria da realidade técnica. Por esta teoria, as pessoas jurídicas são uma realidade social cuja autonomia jurídica se confere pela inscrição dos atos constitutivos no respectivo registro. Como decorrência da adoção desta teoria, e não da teoria da realidade objetiva, a autonomia do ente abstrato não emana automaticamente das relações sociais, mas do encontro desta realidade com a vontade da lei e nas condições que ela impõe. Tanto assim que o Código Civil prevê que a sociedade, já estabelecida pelo contrato, não terá personalidade enquanto não forem registrados seus atos (art. 986). Além disso, em seu artigo 421, a Lei Civil sujeita a liberdade de contratar, inclusive sociedades, aos limites da função social do contrato.
Em decorrência disto, são conhecidas no ordenamento jurídico as hipóteses de inexistência de fato e de desconsideração da autonomia ou personalidade jurídica. Em comum estes institutos tratam de situações em que a realidade social se apresenta em desacordo com as prescrições normativas, recusando-se os efeitos jurídicos usuais. No primeiro caso, se reconhece que a sociedade não tem existência social, ausente o elemento da realidade necessário à aquisição da personalidade. Já nas hipóteses do artigo 50 do Código Civil, em que se dá a desconsideração, se constata que a realidade está em desacordo com as prescrições legais necessárias para outorga da autonomia, ausente o elemento técnico, portanto, que pode ser a própria recusa do sócio à autonomia, nos casos de confusão, ou o desvio de finalidade, isto é, o uso da sociedade para fins desalinhados de sua função social. Como consequência, em ambos os casos se declara que a personalidade jurídica não se encontra respaldada pelo ordenamento jurídico e por isso não poderá ser oposta às pretensões que visem remover o abuso e adequar o direito à realidade.
Em síntese, a desconsideração da personalidade não é uma sanção imposta ao cabo de um procedimento judicial, por uma decisão de natureza condenatória. O sócio, no caso da desconsideração direta, ou a sociedade, no caso da reversa não são condenados cumprir obrigação de outrem. Ao invés, se reconhece que naquelas situações a autonomia patrimonial não foi outorgada de modo que os atos devem ser tidos como praticados pelas pessoas naturais e os bens como se a elas pertencessem. Em outras palavras, a decisão que levanta o véu corporativo é de natureza declaratória, como bem apontou Caricielli Maísa Longo em tese defendida na PUC-SP,8 e não desconstitutiva, muito menos condenatória, pois trata de reconhecer que a relação social se deu com a pessoa natural por recusa do ordenamento jurídico em cobrir com a autonomia os atos abusivos.
Disto decorrem questões processuais importantes que discutirei adiante.
- Apontamentos gerais sobre o IDPJ
Em primeiro lugar, o cabimento do incidente em fase de conhecimento causa espécie. Trata-se, na verdade, de um requerimento de formação de litisconsórcio passivo ulterior, já que a própria lei dispensa o procedimento quando o pedido de desconsideração for veiculado na inicial. A preocupação com a defesa do requerido em incidente separado é no mínimo curiosa já que jamais se admitiu a alteração do polo passivo das ações de conhecimento após a estabilização da demanda (arts. 59, 60, 64 e 71 do CPC/73) com formação de coisa julgada em desfavor de quem não pode contestar ou produzir provas. Por outro lado, se a intenção do legislador foi proteger o requerido das decisões antecipatórias a ele estendidas em razão da ineficácia supervenientemente constatada daquelas deferidas em face do demandado original, a medida viola a garantia constitucional de acesso a uma decisão judicial efetiva.
Em segundo, a ideia de que ao sócio ou à empresa (no caso da desconsideração reversa) se deva conceder oportunidade de defesa distinta da defesa do demandado original é, em última análise, reconhecer autonomia em caso que a lei material não o fez. Vale dizer, consiste em tratar como terceiro na relação litigiosa aquele que, pela lei, foi seu protagonista.
Neste sentido, é razoável afirmar que a lei processual retirou a proteção que a lei material havia conferido ao credor, fazendo com que a parte prejudicada pelo abuso de personalidade seja forçada a obter um novo provimento (desta vez, condenatório mesmo) em face daquele sujeito que já era, afinal de contas, o responsável jurídico pelo dano ab ovo e de juris. A situação é ainda mais grave na medida em que nosso ordenamento não permite impedir a criação de novas empresas pelas mesmas pessoas contra as quais a desconsideração já foi aplicada. Assim, nada impede que após a desconsideração da personalidade na relação primitiva, o sócio da parte requerida crie outras sociedades em uma cadeia infinita de abusos orientados a impedir a satisfação de suas obrigações, impondo ao lesado o manejo de sucessivos incidentes de desconsideração. Em tais casos o aventado efeito surpresa é fundamental para que o prejudicado não seja ele o surpreendido pelos sucessivos abusos.
Nem se diga que nestes casos incidiria a prescrição do artigo 137, dispositivo no todo criticável por sua falta de sistematicidade. O dispositivo em questão prescreve que “acolhido o pedido de desconsideração, a alienação ou a oneração de bens, havida em fraude à execução, será declarada ineficaz em relação ao requerente”. A confusão é evidente e inaceitável uma vez que a desconsideração da personalidade jurídica não tem qualquer relação com o instituto da fraude à execução. Ademais, dizer que a alienação havida em fraude será ineficaz é literalmente repetir a norma do artigo 792, §1º, do código, o que era desnecessário.
A ineficácia dos atos praticados em fraude à execução não tem como pressuposto o reconhecimento de abusos que deem ensejo ao levantamento, tampouco estes se caracterizam pela alienação pelo devedor ao ente abstrato, ou vice-versa. Em outras palavras, aquele que foi lesado por ato em fraude à execução (necessariamente posterior ao processo) deve se valer do meio processual próprio para obter a declaração da ineficácia, ao passo que a desconsideração se volta justamente para os casos em que os atos, não caracterizando fraude à execução exatamente porque anteriores a ela, foram praticados por intermédio da pessoa jurídica abusivamente constituída ou empregada. A norma do artigo 137 não tem qualquer razão para estar posicionada neste capítulo até porque a essência da fraude à execução é a transferência de bens para terceiros, enquanto, como apontei antes, na desconsideração não existe terceiro.
Parece que a norma teria sido enxertada entre as disposições do IDPJ para acalmar os credores receosos de que a demora na obtenção do provimento final no incidente pudesse permitir a alienação de bens pelo sócio, ou pela sociedade no caso de desconsideração reversa. Neste caso a norma está muito mal escrita, bastando que dissesse ser considerada em fraude à execução a alienação pelo requerido no curso do incidente julgado procedente, desde a sua instauração.
De todo modo, a fraude à execução é instituto vocacionado a perseguir bens infungíveis transferidos pelo devedor a terceiros. Contudo, as relações patrimoniais atuais se dão cada vez menos sobre bens infungíveis, mas sobre créditos e ativos financeiros, naturalmente fungíveis e cada vez menos corpóreos. Assim, nem a norma do artigo 137, nem qualquer outra que discipline o IDPJ consegue proteger o credor contra os abusos sucessivos que o devedor possa praticar, tornando virtualmente impossível a satisfação de qualquer crédito caso se exija, sempre, a instauração de IDPJ para alcançar patrimônio que o devedor não detenha em seu nome próprio.
- Dos limites para o diálogo das fontes
De outro lado, a aplicação da norma geral do CPC às relações processuais especiais é excepcional (lex posterior generalis non derogat priori speciali) e deve ser justificada à luz de princípios comuns e objetivos convergentes. No caso em tela, a especialidade da Lei de Execução Fiscal decorre da vinculação do poder público ao princípio da legalidade, presumindo-se a conformidade de seus atos. Ademais, a lei tem como objetivo conceder uma vantagem processual ao ente público. Já o IDPJ orienta-se pelo princípio da ampla defesa e tem como objetivo retirar uma vantagem supostamente indevida dos exequentes.
Como se nota, os princípios informativos divergem, assim como os objetivos das normas, não sendo possível fazer um diálogo de fontes a fim de aplicar o IDPJ aos processos regidos pela LEF.
Na sistemática da lei 8.630/80, o executado, seja ele requerido ou incluído posteriormente, se defende após a penhora. Assim, a aplicação do IDPJ àquele que se pretende incluir ulteriormente no processo, coloca-o em posição mais vantajosa do que a do próprio contribuinte, já que este deverá garantir o juízo para discutir a cobrança e aquele não. Deste modo, antes de “reequilibrar o jogo”, o IDPJ cria desequilíbrios irrazoáveis.
- Inconsistências da decisão do IRDR
No dia 10 de fevereiro de 2020, o Órgão Especial do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, julgando o incidente de resolução de demandas repetitivas nos autos 0017610-97.2016.4.03.0000, fixou a seguinte tese:
“Não cabe instauração de incidente de desconsideração da personalidade jurídica nas hipóteses de redirecionamento da execução fiscal desde que fundada, exclusivamente, em responsabilidade tributária nas hipóteses dos artigos 132, 133, I e II e 134 do CTN, sendo o IDPJ indispensável para a comprovação de responsabilidade em decorrência de confusão patrimonial, dissolução irregular, formação de grupo econômico, abuso de direito, excesso de poderes ou infração à lei, ao contrato ou ao estatuto social (CTN, art. 135, incisos I, II e III), e para a inclusão das pessoas que tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal, desde que não incluídos na CDA, tudo sem prejuízo do regular andamento da Execução Fiscal em face dos demais coobrigados”.
(IRDR n. 0017610-97.2016.4.03.0000. TRF3. Órgão Especial. Julgado em 10.2.2021)
Assim, a Corte Regional distinguiu entre “responsabilidade exclusivamente tributária” e responsabilidade em decorrência de confusão patrimonial, dissolução, formação de grupo econômico, abuso de direito, excesso de poderes ou infração à lei, ao contrato e ao estatuto, ou para inclusão das pessoas que tenham interesse comum, dispensando o incidente no primeiro caso e exigindo no segundo. A opção contraria a evolução da teoria processual com um incomum regresso à teoria imanentista da ação, por meio da qual o procedimento seria uma imanência da causa de pedir próxima, e não do provimento pretendido. Ou seja, retorna ao tempo em que a ação decorria da lei material invocada.
Fixar o cabimento do procedimento incidental de acordo com o dispositivo legal invocado faz pouco sentido, ainda mais diante de realidades em que diferentes interpretações dos fatos possam levar a distintos enquadramentos jurídicos, comum nos casos de fraudes múltiplas ou simplesmente em razão da desatualização dos artigos do Código Tributário. De igual sorte, não raros são os casos em que mais de uma causa de pedir opera em paralelo. Imagine-se, por exemplo, uma sociedade incorporada formalmente por outra que depois tenha sido dissolvida irregularmente nos termos do enunciado 435 da súmula do STJ. Para o reconhecimento da responsabilidade decorrente do primeiro ato o TRF veda que se aplique o IDPJ (“não cabe”) mas no segundo afirma ser imprescindível! Quid juris?
Além disso, não há identidade perfeita entre os dispositivos elencados e a tipologia proposta pelo Tribunal: “responsabilidade exclusivamente tributária” ou “responsabilidade que demande comprovação”. Na verdade, as duas categorias sequer constituem uma classificação, uma vez que o oposto de responsabilidade exclusivamente tributária é responsabilidade não exclusivamente desta ordem, ou seja, responsabilidade ainda que parcialmente oriunda de outro ramo do direito. De outro lado, a responsabilidade que demanda comprovação de fatos tais ou quais se opõe àquela que não depende de prova (presunção) ou, quiçá, aquela que se extrai de prova plena e direta.
Há hipóteses de sucessão (art. 133) que demandam prova, como no caso de se precisar provar a aquisição de fundo de comércio ou a cessação da exploração do objeto pelo alienante. Por outro lado, o CTN é anterior à previsão da cisão pela lei civil, sendo certo que se admite a aplicação do artigo 132 ao caso, não sem reconhecer a necessidade de comprovação do destino do patrimônio. De igual sorte, o artigo 134 demanda, igualmente, comprovação de omissões pelas quais os intervenientes sejam responsáveis e tampouco se pode dizer que esta responsabilidade seja exclusivamente tributária, já que remete a diversas figuras da lei civil. Nestes casos é quase inacreditável que o tribunal tenha decidido ser incabível o incidente, haja vista que a opção do Exequente por utilizá-lo não causa malefícios ao Executado e o provimento a ser obtido é rigorosamente idêntico ao que se irá obter nos casos em que o mesmo tribunal reputou necessário.
Por outro lado, a inclusão do artigo 135 no rol das causas de pedir que demandam instauração do incidente dá ensejo à situação estarrecedora. Com efeito, o enunciado 435 da súmula do Superior Tribunal de Justiça presume a dissolução irregular, e a confusão patrimonial, nos casos que especifica, e autoriza o redirecionamento da cobrança literalmente. Desta forma, nos termos da jurisprudência sumulada, não há necessidade de produção de prova que não a própria certidão do Oficial de Justiça que já consta dos autos, de modo que o IDPJ, neste caso, será instaurado com uma única prova e só poderá ser rejeitado por prova, igualmente literal, a cargo do devedor, de que a empresa continua funcionando.
Outra hipótese de solução curiosa com base na decisão do TRF é o do empresário individual em nome próprio, ou seja, que não constituiu EIRELI. Uma vez que tais contribuintes possuem CNPJ, mesmo sem terem personalidade autônoma, e que sua responsabilidade decorre exclusivamente da lei civil, o acórdão do IRDR pode estimular os mais criativos a pensarem que em tal caso o incidente seria obrigatório apesar de não ser hipótese de desconsideração, porque personalidade não há.
- Conclusão
Conforme apontei ao longo do texto, o incidente de desconsideração de personalidade jurídica foi incorporado ao Código de Processo Civil por influência de agentes econômicos interessados em evitar o efeito surpresa de execuções e cumprimentos de sentença em processos dos quais não tinham conhecimento. Neste sentido, mencionei também que a previsão do IDPJ em processo de conhecimento é anacrônica na medida em que já não se admite a formação de coisa julgada contra quem não teve a possibilidade de contestar e produzir provas em sua defesa e que, quanto aos provimentos de natureza antecipada de urgência, a imposição do IDPJ viola o princípio da efetividade da jurisdição, uma vez que o deferimento em tais casos pressupõe a existência de um perigo incompatível com a demora do procedimento incidental.
Do ponto de vista sistemático, registrei que o IDPJ é incompatível com o modelo especializado de execução e defesa previsto na lei 6.830/80 em razão de os princípios e objetivos que o inspiram serem contraditórios.
Finalmente, indiquei que a decisão do TRF3 no IRDR é formalmente inconsistente na medida em que opera com categorias conflitantes e imprecisas, afrontando até mesmo o entendimento sumulado de tribunal superior, trazendo mais dúvidas do que certezas.
À guisa de conclusão, defendo que o IDPJ deve ser tido como inaplicável às execuções fiscais, bem como ao processo de conhecimento, restringindo seu âmbito de aplicação aos cumprimentos de sentença e às execuções de título extrajudicial regidas pelo procedimento codificado, ressalvada em todo caso a possibilidade de concessão de tutela antecipada de urgência nestes ritos quando imprescindível ao resguardo do interesse perquirido.
Alternativamente, em se entendendo aplicável o IDPJ às execuções fiscais, defendo que o critério para a avaliação de sua necessidade seja exclusivamente processual em respeito à teoria abstrata da ação, baseado no tipo de provimento pretendido, na profundidade ou na extensão da atividade cognitiva a ser desenvolvida, ou ainda na natureza das partes envolvidas, como ensina a doutrina processualista de longa data. Com base nisso, proponho que a instauração do incidente seja considerada facultativa nos casos em que a responsabilidade decorra exclusivamente da lei (pouco importando se tributária ou não), ou de fatos cuja ocorrência seja presumida, ou que possam ser comprovados direta e plenamente por documento. Assim, estariam dispensados do IDPJ casos como o de dissolução presumida por certidão do oficial de justiça (enunciado 435 da súmula do STJ), o de extinção voluntária com débito (art. 9º da LC 123/2006), os de incorporação, transformação e fusão, os de sucessão universal ou singular, o do empresário individual, entre outros. De outro giro, nas hipóteses em que fosse necessária a produção em contraditório de provas indiretas, seria exigível a instauração do incidente a fim de garantir a paridade de armas na medida em que, do contrário, o executado não poderia fazer contraprova sem garantia do juízo por vedação expressa da lei. Ademais, era de bom alvitre que a decisão do IRDR, dado seu caráter objetivo, ressalvasse expressamente a possibilidade de concessão de tutela antecipada de urgência requerida no próprio incidente a fim de evitar o esvaziamento do direito.
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1 Art. 134.
2 Art. 133, §1º.
3 Art. 134, §4º
4 Art. 135
5 Disponível clicando aqui
7 TJDF, AC 0702274-57.2019.8.07.0001, 6ª Turma Cível, Rel. Des. Alfeu Machado, DJe de 5/6/19
Atualizado em: 28/4/2021 16:29
Daniel Telles de Menezes
É Coordenador da carreira de Procurador da Fazenda Nacional da ANAFE. Mestre em Políticas Públicas pela UFAB. Graduado em Direito pela UNIRIO.
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