Como mostrou o Correio na edição de ontem, o nível de descontentamento é grande na Polícia Federal. Na pesquisa inédita realizada por meio da rede interna de computadores da PF, 57,8% dos delegados, peritos, papiloscopistas, escrivães, agentes e pessoal administrativo responderam que pretendem deixar a carreira na primeira oportunidade que tiverem. Por ser uma espécie de Olimpo do setor público, onde bons salários e status são marcas registradas, a taxa surpreende.
Wanderley Codo, professor de psicologia social e do trabalho da Universidade de Brasília, explica que a frustração e o sentimento de derrota dos servidores estão associados ao fato de que raramente o esforço diário se traduz em algo concreto. Diferentemente do que ocorre na iniciativa privada, os processos e o excesso de regras fazem com que o servidor se sinta “apenas mais um”. “Há no setor público grande ausência de vínculo com o produto. Às vezes, o salário e outras queixas viram apenas desculpa, uma forma de resumir as coisas para justificar outras insatisfações”, completa.
Reivindicações
Desde 2008, o Executivo vem sendo alvo de modificações. O governo baixou medidas aumentando a remuneração de quase todo o quadro, alterou a estrutura de muitas carreiras, implementou novas ferramentas de gestão com foco no desempenho e introduziu conceitos que dão maior previsibilidade funcional aos atuais e futuros servidores. Essa pequena revolução, no entanto, não tem sido capaz de amenizar os dramas.
Os advogados públicos são um exemplo disso. Responsáveis por defender os interesses da União, ingressam com contracheque de R$ 14 mil. “As mudanças na remuneração reduziram o índice de evasão”, reconhece Rogério Vieira Rodrigues, presidente da União dos Advogados Públicos Federais do Brasil (Unafe). Mas como dinheiro não é tudo, há reivindicações por melhores condições de trabalho e contra a fórmula de progressão na carreira introduzida recentemente.
Juliana Barral, mestre em administração pública, adverte que boa remuneração não se traduz em felicidade. “Esse é o primeiro engano do candidato e da própria organização”, diz. Segundo ela, do ponto de vista estrutural, ainda há muito o que se avançar no Brasil. Recrutar e formar melhor a mão-de-obra seria um bom começo. “Se a pessoa não consegue ver o resultado do que faz, ela trabalha para quê? A organização precisa dar desafios ao profissional, estimulá-lo sempre”, reforça.