Acostumada a se dividir entre as atividades da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) onde trabalha há 20 anos, o voluntariado no Observatório Social do Brasil (OSB), uma organização da sociedade civil para controle social de gastos públicos, coordenação de livros e realização de palestras, Regina Hirose, 51, nunca reclamou da vida agitada.
Formada em Direito pela Universidade Estadual de Londrina (UEL), com mestrado em Direito Constitucional e em Direito Internacional pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP) e mestrado em Políticas Anticorrupção pela Universidade de Salamanca (Espanha), Regina ainda faz parte do Comitê Gestor do “Programa Mulher Cidadã – Cidadania Fiscal para Mulheres”.
Mas a vida surpreende. Pode estar tudo bem em um dia, dormimos e, quando acordamos no dia seguinte, recebemos uma impactante notícia que vira tudo de cabeça para baixo. Foi isso que aconteceu na vida de Regina Hirose.
Nascida na cidade de Faxinal, no Paraná (PR), filha de pai nissei e mãe japonesa, Regina tem, entre muitas qualidades, características marcantes como forte senso de responsabilidade e compromisso, otimismo acentuado, perseverança, garra e muita fé.
Bem provável que o mix de todas elas tenha mantido Regina de pé ao se despedir para sempre da mãe, em abril de 2021. Ela ainda tentava lidar com a dor da perda quando outras dores e incômodos surgiram. Dessa vez não eram dores da alma. Eram dores físicas intensas.
“Fiquei inchada, sentia muita fadiga, barriga estava alta”, conta. Estava dada a largada para a peregrinação em vários laboratórios, salas de médicos e diversos exames de imagens como ultrassons e ressonância magnética. Uma maratona para tentar descobrir o que havia de errado com Regina até que, em junho de 2021, veio a primeira constatação. Havia uma massa tumoral na região do abdômen.
“Fiz inúmeros exames de sangue em um dos melhores laboratórios de São Paulo, mas nenhum deles acusou alterações nos marcadores de câncer e nenhum médico solicitou biópsia para entender, de fato, o que era aquela massa abdominal que só crescia”, lembra.
Mesmo sem a biópsia, sem um diagnóstico fechado, alguns ginecologistas acharam por bem realizar cirurgia. Uns queriam extrair o tumor, outros queriam fazer histerectomia (retirada do útero). “Não fiquei convencida de que era um caso cirúrgico”.
Sentindo dores e muito desconforto, Regina, que atualmente mora em São Paulo, precisava voltar ao Paraná para resolver questões práticas a respeito do falecimento da mãe. Em Londrina (PR), com náuseas e bem abatida, decidiu consultar um gastroenterologista, Dr. Ricardo Nakamura. Ele pediu novos exames de sangue. Foi então que o diagnóstico alarmante chegou. “Procure imediatamente um hematologista (especialista em sangue) ou um oncologista (especialista em câncer). Há sinais de que você está com leucemia”, disse o gastro.
Regina levou um susto, ficou abalada, o chão se abriu sob seus pés: “Por que isso agora? Acabei de enterrar minha mãe”. Uma carga emocional muito pesada para a pequena, grande mulher. Pequena no tamanho, mas grande de alma e fé inabalável.
A essa altura, crescendo de forma acelerada, a massa abdominal de 15 X 17 cm começou a comprimir os órgãos internos como estômago, rins, bexiga, intestinos. O desconforto só aumentava. Comer passou a ser um sacrifício. Além disso, os problemas de circulação se agravaram.
Regina é uma mulher resiliente e que tem certeza de que os anjos e arcanjos estão presentes em sua vida. “Sei que tudo é impermanente. Tudo tem um tempo, tem seu ciclo. Estava na hora de exercitar ainda mais a minha fé, entregar e confiar em Deus”, revela.
No dia 3 de agosto, Regina pegou o primeiro voo para São Paulo. Depois de uma avaliação feita no Hospital Albert Eisntein, nesse mesmo dia, foi encaminhada para o Hospital São Luiz, onde enfim os médicos fizeram uma biópsia para saber com o que estavam lidando. O diagnóstico ganhou nome e sobrenome: Leucemia Mieloide Aguda (LMA).
Transferida para a ala especializada do Hospital Vila Nova Star, em São Paulo, as fervorosas orações surtiram efeito. Os anjos e arcanjos entraram em cena. O transplante de medula não seria necessário. O medicamento de última geração, produzido nos EUA, acabara de ser aprovado no Brasil pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). As notícias eram boas e promissoras.
A doença que acometeu Regina não é incomum, infelizmente. Mas o tamanho que o tumor alcançou é raro. Deu-se, assim, início aos três ciclos de quimioterapia e às 15 sessões de radioterapia que reduziram a massa abdominal para 5 cm até virar apenas uma cicatriz.
Regina perdeu cabelos, a pele ficou ressecada e chegou a pesar 46 kg. Teve dores de cabeça e diarreias, perdeu paladar e olfato. Mas como sempre cuidou bem da saúde, o coração, os rins e os outros órgãos suportaram o impacto das altas doses de medicamentos. Apesar dos efeitos colaterais, o tratamento deu certo.
“Não houve nenhum corte. Não foi necessário operar. Foi uma graça alcançada”, reconhece Regina.
O feliz desfecho foi divulgado em eventos direcionados a médicos e a pesquisadores. E sob a batuta do Dr. Eduardo Magalhães Rego, Professor Titular da Faculdade de Medicina da USP, a equipe de hematologistas pretende publicar um artigo científico sobre o tratamento bem-sucedido.
Hoje Regina está curada. O apoio dos familiares, o carinho das amigas e dos amigos, as mensagens encorajadoras de colegas e as correntes de orações foram fundamentais nesse processo. Além disso, a fé e a atitude mental positiva de Regina foram determinantes para o sucesso do tratamento.
“Eu me sentia como um bambu no hospital. Firme, forte e flexível. O bambu enverga, mas não quebra. Sabia da minha realidade e cabia a mim escolher qual seria minha postura durante o processo. Decidi adotar a esperança ativa. Fazer minha parte e deixar a passividade de lado”.
Durante o tempo em que ficou internada, Regina nunca abandonou completamente suas atividades. Continuou coordenando a edição do segundo livro “Carreiras Típicas de Estado: prevenção e enfrentamento à corrupção sob a perspectiva internacional”. A obra coletiva foi publicada pela Editora Revista dos Tribunais em 2023, com 29 artigos que relatam o impacto da corrupção na sociedade e as medidas tomadas por diversas carreiras públicas para prevenir e combater a prática.
Um livro sobre a sua jornada para vencer a Leucemia Mieloide Aguda (LMA) está entre os planos de Regina, principalmente para que meninas e mulheres sejam alertadas quanto a sintomas e à importância de consultas com especialistas para acesso ao tratamento adequado.
“A morte nunca me assustou. Faz parte do ciclo da vida. Crescemos, nos tornamos adultos e depois vem a fase do declínio. É preciso passar por essa fase com elegância e responsabilidade, sendo útil para as pessoas. Não deixei a doença me imobilizar e nem me desanimar. Essa marcante experiência reforçou a minha fé. Hoje continuo realizando atividades que considero importantes para mim e permaneço firme no propósito de ajudar outras pessoas”, enfatiza.
Fonte: intranet/AGU