Rui Magalhães Piscitelli *
Em sessão deliberativa remota do Senado Federal, datada de 10 de dezembro de 2020, foi proferido pelo senador Antonio Anastasia o Parecer nº 181/2020-PLEN/SF, concluindo pela aprovação do PL nº 4253/2020 (substitutivo da Câmara dos Deputados ao PLS nº 559/2013), com a apresentação das Emendas números 1 a 11 – PLEN, de redação, e apresentação de ressalvas, bem como de complementação posterior. Esse, pois, será o nosso cenário de análise, com enfoque à atuação da advocacia pública.
A partir da promulgação da Constituição Federal de 1988, a administração pública ganha assento constitucional, especificamente no capítulo VII do título III da Organização do Estado.
Por isso, a advocacia pública não se confunde com administração pública. Na atividade de consultoria e de assessoramento jurídicos, os advogados públicos exercem uma função típica de controle daquela.
Assim, pois, aos advogados públicos cumpre, na função de consultoria e de assessoramento jurídicos, a defesa do próprio Estado brasileiro, de maneira permanente, e com as prerrogativas que lhe são próprias, justamente para o exercício dessa função de controle governamental.
Nesse sentido, ganha relevo a manifestação jurídica prévia dos advogados públicos nos processos licitatórios, a fim de assegurar a segurança jurídica necessária aos gestores públicos.
Mas outro enfoque que não pode escapar à nossa análise é a segurança jurídica que as manifestações jurídicas prévias proporcionam à aplicação de sanções, no âmbito de tais processos administrativos. Afinal, eles envolvem, além de vultosos recursos públicos, a concreção dos princípios constitucionais e legais aplicáveis à espécie.
No artigo 10 do avulso oriundo da Câmara dos Deputados, a representação judicial e extrajudicial dos agentes públicos que atuaram nos processos licitatórios e na execução dos contratos administrativos é prevista, com defesa pelo órgão de advocacia pública.
No âmbito federal, tal disposição já se faz presente, não somente para atos de licitações e de contratos administrativos, mas para todos os atos praticados por autoridades e agentes públicos; contudo, há regulamentação própria para que a defesa pelo órgão da advocacia pública seja dirigida somente em casos em que não se constatou dolo ou em que não se discrepou das recomendações postas nos pareceres jurídicos.
A elaboração das minutas de documentos que regerão a fase externa está contida na fase preparatória, ou interna, culminando as duas fases com a prolação de parecer jurídico.
A propósito do prévio parecer jurídico, vem ele previsto no final da fase preparatória, ou interna, no artigo 52 do projeto.
Sobre tal controle por parte da advocacia pública, tão relevante às licitações e contratações públicas, passou a constar que o referido órgão jurídico “realizará controle prévio de legalidade mediante análise jurídica da contratação.”
Por oportuno, o caráter não vinculativo das manifestações jurídicas vem no parágrafo segundo do seu artigo 52; todavia, sendo prevista responsabilidade pessoal e exclusiva do gestor que não seguir as recomendações jurídicas.
Aliás, previsão expressa é trazida no referido art. 10, a saber, “em razão de ato praticado com estrita observância de orientação constante em parecer jurídico elaborado na forma do § 1º do art. 52 desta
Lei“, o que demonstra a importância, para os agentes públicos, da observância das recomendações postas nas manifestações jurídicas.
Também enaltecemos a previsão trazida no parágrafo quarto do seu artigo 52, a saber: o controle prévio dos convênios e demais ajustes congêneres, bem como dos aditivos contratuais e dos ajustes consensuais.
A propósito da dispensa de prévia manifestação jurídica, trazida no parágrafo quinto do referido artigo, a Advocacia-Geral da União (AGU) tem, prudentemente, adotado algumas excepcionalidades, como contratações de baixo valor, objeto da Orientação Normativa nº 46, de 2014.
A propósito, ainda, a adoção de minutas padronizadas de documentos – como edital, termo de referência e contratos administrativos – já é exigência prevista atualmente, conforme se constata do art. 29 da IN nº 05, de 2017, no âmbito federal.
A AGU tem disponibilizado, no seu sítio eletrônico, vários desses documentos, inclusive check lists, para que a administração possa antecipar os pontos requeridos de aperfeiçoamento nos pareceres jurídicos obrigatórios em licitações.
Os arts. 150 a 153 trazem a possibilidade de previsão, nos contratos administrativos, da resolução extrajudicial dos conflitos. No ponto, lembramos que as advocacias públicas têm importante papel nesse instituto, já previsto desde 2015 na Lei nº 13.140 e também para estados, DF e municípios. Todavia, ainda não percebemos a operacionalização estendida de tal instituto.
Lembremos que as advocacias públicas não fazem parte da administração pública stricto sensu, senão são função essencial à Justiça, com assento constitucional, daí sua imparcialidade para a atuação nessas câmaras de conciliação, mediação e arbitragem.
As sanções contratuais vêm previstas no art. 155, com análise jurídica obrigatória no caso de declaração de inidoneidade, que extrapola seus efeitos para todas as administrações públicas, de todos os entes federados. Eis uma boa inovação para o maior controle da juridicidade, o da prévia manifestação jurídica nos casos de declaração de inidoneidade, o qual recomendamos que, também, aos impedimentos de licitar, ao menos, também deveria ser estendida.
No seu art. 168, são previstas, como inovação, linhas de defesa para o controle das licitações e da execução dos contratos administrativos, a saber:
“II – segunda linha de defesa, integrada pelas unidades de assessoramento jurídico e de controle interno do próprio órgão ou entidade.”
O parágrafo terceiro do referido art. 168 traz as responsabilidades e os deveres das linhas de defesa.
Por fim, o projeto enviado à sanção do presidente da República estabelece a sua vigência, nos seus arts. 190 e 191, a partir de dois anos da publicação da lei, somente com vigência imediata a remessa dos dispositivos penais ao Código Penal.
Anote-se, assim, que os dispositivos sobre crimes previstos na Lei nº 8666, de 1993 ficam revogados imediatamente, com a entrada em vigor dos dispositivos penais previstos, desta feita, no Código Penal, na publicação dessa legislação. E, quanto às demais disposições, somente após dois anos da publicação do projeto enviado à sanção presidencial.
Por fim, o art. 191 estabelece as regras de transição, necessárias a qualquer alteração legislativa substancial.
A título de breves conclusões, podemos tirar que a Advocacia Pública vem, na novel legislação, tendo seu espaço constitucional garantido, servindo como uma instância de controle da sociedade brasileira sobre os processos de aquisições (de bens e serviços) feitas pelo Estado nacional.
Quanto à nova legislação, ela incorpora os avanços das legislações já existentes no Brasil, avançando em direção de um Estado mais eficiente.
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* Rui Magalhães Piscitelli é Advogado Público Federal associado à ANAFE e especialista em processo civil, é mestre em Direitos Fundamentais e autor de diversas obras em Direito Administrativo e Financeiro, áreas nas quais é professor de graduação e de pós-graduação.
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