Ninguém, em sã consciência, nega os altos índices de corrupção e malversações do patrimônio público em curso no Brasil, praticamente desde a chegada das caravelas. Alimentados, entre outros fatores, pela cultura de levar vantagem contra tudo e contra todos, existem inúmeros esquemas de corrupção e congêneres conduzidos individualmente, coletivamente e politicamente por agentes públicos e privados.
Os esquemas individuais de corrupção são aqueles em que um agente público, de forma isolada, sem concurso de outros agentes, aproveita de sua posição no seio da Administração Pública e obtém vantagens ilícitas, em regra, pecuniárias. Já os esquemas coletivos envolvem a atuação indevida de um conjunto de agentes públicos, normalmente colegas de trabalho. Nos esquemas políticos de corrupção, o agente público integra sofisticadas quadrilhas organizadas politicamente, não raro com a participação de agentes políticos com grande projeção social e muito bem localizados na estrutura do Poder Público.
Infelizmente, a atual realidade brasileira mostra uma ampla preferência da sociedade pelas ações repressivas no combate à corrupção, às fraudes e expedientes correlatos. Por inúmeras razões, aposta-se em heróis (verdadeiros salvadores da Pátria), operações midiáticas e punições exemplares, especialmente prisões. Além de afetar uma parte mínima dos esquemas de corrupção, os custos envolvidos na vertente da repressão são consideravelmente elevados. Ademais, são notórios e frustrantes os revezes, por anulação, de processos conduzidos com graves vícios formais.
O ambiente social referido enfraquece demais a percepção de que a prevenção, adequadamente institucionalizada, é o caminho mais eficiente para o resguardo do patrimônio público. Entre outros aspectos, a melhor relação custo-benefício e a maior amplitude das medidas preventivas recomendam a adoção prioritária dessa vertente.
Normalmente, as medidas preventivas comportam cinco grandes linhas de ações: a) gestão da ética e integridade; b) controles específicos (em relação às ações mais sensíveis dentro da Administração Pública); c) transparência; d) redução significativa da discricionariedade na execução orçamentária e e) redução drástica da quantidade de cargos comissionados na Administração Pública federal, estadual, distrital e municipal.
No âmbito da Administração Pública, os órgãos e agentes da Advocacia Pública desempenham um papel muito singular. Trata-se de um mecanismo de controle com enorme potencial de eficiência preventiva em relação às ocorrências de corrupção e similares. Afinal, entre outras relevantes funções (representação judicial, recuperação de créditos públicos não pagos, etc), analisa, antes de editados, firmados ou encaminhados, praticamente todos os atos administrativos, contratos, normativos internos e proposições legislativas.
Percebe-se, com facilidade, que a atuação firme da Advocacia Pública pode evitar, entre outros, desvios, desperdícios, despesas excessivas ou indevidas, processos de responsabilização, operações de investigação e demorados e complexos procedimentos de reparação.
O fortalecimento institucional dos órgãos da Advocacia Pública e de seus membros funciona como um dos melhores investimentos no combate à corrupção, fraudes e outras malversações do patrimônio público. Provavelmente, não existem atuações funcionais mais abrangentes contra a corrupção e correlatos. Com efeito, os advogados públicos trabalham diariamente em quase todos os órgãos públicos pelo País afora. Os custos e a eficiência dessas ações preventivas não possuem termo de comparação com a ênfase em ações repressivas ou punitivas.
Ocorre, entretanto, que subsiste uma considerável deficiência e, mesmo, ausência de instrumentos adequados para que a Advocacia Pública possa realizar esse combate prévio aos ilícitos e outras missões institucionais no ponto mais alto de eficiência possível. Destaco, em resumo, certos conjuntos de providências a serem implementadas: a) redução drástica do número de cargos comissionados e das cadeias de comando; b) gestão democrática com intensa utilização de processos seletivos para os postos de direção; c) gestão fortemente baseada em órgãos e decisões coletivas, inclusive para sanções disciplinares; d) independência técnica nos níveis adequados e e) prerrogativas (não privilégios) como contenção às pressões de superiores hierárquicos e dos governantes da hora.
No caso dos órgãos e carreiras jurídicas da Advocacia-Geral da União (AGU) são urgentes e inafastáveis ajustes constitucionais voltados para o indispensável fortalecimento institucional. Ademais, as premissas antes referidas exigem inserção numa moderna lei orgânica que coloque a instituição e seus integrantes (Advogados da União, Procuradores Federais, Procuradores do Banco Central e Procuradores da Fazenda Nacional) como guardiões dos mais caros interesses do Estado Democrático de Direito e dos cidadãos brasileiros. Longe, bem longe, dos caprichos dos governos de plantão.
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