Publicado em 22 de mar de 2021
*Clique aqui para conferir a programação da segunda edição do evento Diálogos Institucionais, em comemoração ao Dia mundial da Água.
ANA SALETT MARQUES GULLI é especialista em Direito do Saneamento pelo Instituto de Ciências Jurídico-Políticas da Universidade de Lisboa. Procuradora Federal de carreira, exerce atualmente o cargo de Procuradora-Chefe da Fundação Nacional de Saúde (FUNASA), já exerceu os cargos de Procuradora-Chefe da Agência Nacional de Mineração (ANM), Consultora Jurídica Adjunta do Ministério de Minas e Energia e Defensora Pública no Estado do Tocantins. É também Coautora da obra coletiva Estudos de Direito do Saneamento.
Conversamos com ela sobre o tema por ocasião do Dia Mundial da Água, celebrado nesta segunda-feira (22).
- A água é considerada um direito humano?
Sim, o acesso à água potável é um direito humano reconhecido em cenário internacional.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em Paris, em 10 de dezembro de 1948, por meio da Resolução 217 A III, como uma norma comum a ser alcançada por todos os povos e nações.
Desde então, aos direitos relacionados à vida e às liberdades humanas foram incorporados àqueles ligados ao bem-estar dos seres humanos. Assim, em 28 de julho de 2010, a Assembleia Geral das Nações Unidas, por meio da Resolução A/RES/64/292, reconhece o direito à água potável segura e limpa e ao saneamento como direitos humanos essenciais para o pleno gozo da vida e de todos os direitos, exortando os Estados e organizações internacionais a fornecer recursos financeiros, capacitação e transferência de tecnologia via canais de assistência e cooperação, em particular para os países em desenvolvimento, com o objetivo de aumentar esforços para viabilizar o fornecimento de água potável segura, limpa, acessível, assim como, saneamento para todos.
Cabe ainda ressaltar que, em 2015, a Assembleia Geral da ONU reforçou na Resolução A/RES/70/169 (1085776) que o direito à água potável e ao saneamento são direitos humanos.
- Qual a situação atual do acesso a esse direito no Brasil?
Conforme dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento, do Ministério do Desenvolvimento Regional – SNIS/MDR/2019, divulgados pelo Instituto Trata Brasil, atualmente, 83,7% (oitenta e três virgula sete por cento) dos brasileiros são atendidos com abastecimento de água tratada; sendo, todavia, quase 35 milhões de brasileiros sem o acesso a este serviço básico.
Separando-se por regiões, temos que na Região Norte, 57,5% (cinquenta e sete virgula cinco por cento) da população é abastecida com água tratada; na Região Nordeste, o abastecimento de água alcança 73,9% (setenta e três virgula nove por cento) da população; na região Sudeste 91,1% (noventa e um virgula um por cento) da população é abastecida com água tratada; na Região Sul, o índice de atendimento total de água é de 90,5%( noventa virgula cinco por cento); e, por fim, a Região Centro-Oeste abastece 89,7% (oitenta e nove virgula sete por cento) da população com água tratada.
- Quais as políticas públicas existentes para viabilizar o acesso à água?
A água é um dos componentes do saneamento básico e, nesse âmbito, compete ao titular do serviço de saneamento formular a respectiva política pública conforme a demanda específica.
No caso de interesse local, os Municípios e o DF são os titulares do serviço de saneamento, e, no caso de interesse comum, os Estados também podem exercer essa titularidade em conjunto com os Municípios que compartilham efetivamente instalações operacionais integrantes de regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões.
No âmbito Federal, compete à União a implementação da Política Federal de Saneamento Básico, consubstanciada no apoio a Estados e Municípios por intermédio do aporte de recursos financeiros e apoio técnico com fins de contribuir para o desenvolvimento nacional, a redução das desigualdades regionais, a geração de emprego e de renda, a inclusão social e a promoção da saúde pública, dentre outros.
Além das parcerias estatais, a União fomenta ações com instituições da sociedade civil e consórcios, no intuito de promover o incremento do acesso à água de qualidade.
- Qual o papel da PGF/AGU na implementação dessas políticas públicas?
Os membros da Procuradoria-Geral Federal em Exercício nas autarquias têm relevante papel na implementação da política pública, eis que atestam a legalidade dos procedimentos de transferência de recursos federais para os municípios, consórcios ou entidades privadas sem fins lucrativos, mediante a análise dos processos administrativos em todas as suas fases, bem como prestam consultoria e assessoramento às autoridades administrativas conferindo a devida interpretação jurídica às norma que regem o tema, sempre no interesse público.
O controle da legalidade também é exercido ao término dos instrumentos jurídicos quando, após a análise da prestação de contas, se faz necessária a adoção de medidas com fins de obtenção de ressarcimento aos cofres públicos decorrente de dano ou até mesmo, proposição de ação de improbidade se houver suspeita de ato de corrupção.
Além disso, a Procuradoria contribui com a atividade regulatória da Autarquia ao analisar a adequação dos atos normativos propostos.
- Quais as expectativas para o incremento do acesso à água no Brasil?
Com a recente alteração do Marco Legal do Saneamento por meio da Lei nº 14.026, de 15 de julho de 2020, espera-se que haja uma melhora na oferta do saneamento básico no Brasil incluindo-se, obviamente, o acesso à água.
A referida alteração legal definiu de forma clara quem é o titular do serviço do saneamento; conferiu à Agência Nacional de Águas e Saneamento competência para editar normas de referência para regulação da prestação dos serviços públicos de saneamento; estabeleceu a necessidade de inclusão de metas nos contratos de prestação dos serviços; e, ainda, viabilizou o aporte de capital privado por meio de concessão do serviço mediante licitação.
Entendo que o novo cenário legal pode propiciar um melhor planejamento, uma boa regulação e, consequentemente, uma gestão adequada dos serviços, beneficiando, assim, toda a sociedade brasileira.
DIÁLOGOS INSTITUCIONAIS
Em alusão à data, o Centro de Estudos da ANAFE convida para a 2ª segunda edição do evento Diálogos Institucionais.
Data/Horário: 31 de março, às 17h
Temas: “O novo marco do saneamento” e “Acesso à água como direito e o papel da Advocacia Pública”