Desconhecidos, sem prerrogativas funcionais típicas de magistrados e membros do Ministério Público, para não se falar na sensível discrepância de remuneração, os advogados da União previnem os atos de improbidade nas Consultorias Jurídicas dos Ministérios, opinando em processos administrativos e licitações de valores milionários.
Seus pareceres prévios detectam inconsistências, ilegalidades e desvios, malogrando os esforços daqueles gestores dotados da chamada "ousadia dos canalhas". Situações desgastantes, pressões políticas e atritos com integrantes da Administração Pública, políticos e fornecedores fazem parte dessa realidade, tão comum quanto desconhecida do grande público.
A AGU, ao propor as 400 ações, assume a linha de frente de um enfrentamento que hoje se liga, no inconsciente coletivo, ao Ministério Público e à Polícia Federal. A notável iniciativa da Procuradoria-Geral da União e de todos os colegas envolvidos na força-tarefa tem o mérito de levar à população uma imagem nova do órgão, colocado como um ator efetivo na luta pela construção de um Brasil de mãos limpas.
Mais do que isso. Essa operação destaca a superação da velha dicotomia entre o interesse público primário, tutelável pelo Ministério Público, e o interesse público secundário, defendido pela AGU, conceitos nascidos sob o império da doutrina de Renato Alessi, divulgada no Brasil graças a Celso Antônio Bandeira de Mello. A AGU também é legítima para a defesa do interesse público primário, naquilo que se refira diretamente à União.
A Lei 7.347, de 24 de julho de 1985, que regula a Ação Civil Pública, em seu artigo 5o, define expressamente a legitimidade da União, que tem na AGU seu órgão de procuratura judicial, para o ajuizamento dessas ações. A Advocacia-Geral, portanto, simplesmente concretiza um comando da Lei da Ação Civil Pública, aparentemente esquecido.
Não é de se temer que haja uma superposição de atribuições com o Ministério Público, órgão que já conquistou as afeições sociais pelo excelente ofício de defesa da Constituição e do interesse público primário. A AGU tem por objeto a defesa da ordem jurídica e, como tal, é de ser admitida na tutela desses relevantes interesses. Demais disso, há tanta corrupção no Brasil, como revelam a História e as estatísticas, que a assunção pela AGU desse mister há de ser encarada como mais um esforço na construção de uma pátria livre da improbidade.
Na verdade, a própria estrutura funcional do órgão favorece o êxito dessas ações. A AGU possui um eficiente acompanhamento das ações desde os juízos de primeiro grau até o Supremo Tribunal Federal. Nos últimos anos, desenvolveu-se a cultura de um "escritório de advocacia" no órgão, o que implica a visita aos gabinetes dos magistrados, entrega de memoriais e realização de sustentações nas sessões de julgamento. Os corruptos, em muitos casos favorecidos pela prescrição e por outras manobras de retardamento dos processos, encontraram nos advogados da União diligentes opositores.